José Moreira Gonçalves nascido em 9 de novembro de 1954 (67 anos) e Rosa Maria Vieira Ferreira Gonçalves nascida a 22 de abril de 1957 (65 anos), naturais de Oliveira do Arda, concelho de Castelo de Paiva, foram entrevistados no dia 18 de julho de 2022.
Começam a recordar a vida a partir dos cinco anos de idade visto que José afirma ser nessa idade que “tem perceção de começar a recordar e a viver mesmo intensamente a vida”.
José lembra de Oliveira do Arda ser uma aldeia pobre com muito poucas casas, apesar de o Lugar de Oliveira do Arda ter um enorme terreno, sendo todas as habitações muito dispersas desde o Monte de São Domingos até à Estação.
José e Rosa falam que quase todas as famílias viviam das Minas do Pejão e que a maioria das senhoras casadas ficavam em casa a educar os filhos e a trabalhar na agricultura, pois não haviam pré-escolas nem infantários.
José ainda relembra que não havia eletricidade nem água nas casas e que eram as próprias pessoas que tinham que se deslocar aos fontenários para transportar água para suas casas, compartilhando uma memória sua com o seu irmão (Manuel).
José ainda compartilha a memória de depois da escola ir para a Quinta da Fervença passar o resto do dia a guardar os rebanhos. E ainda tem um diálogo com a sua esposa, sobre passar os seus tempos de lazer no “Crokas”, caracterizando como era antigamente o local, contando as “brincadeiras de criança” que faziam nesse sítio e acrescentando que foi lá onde aprendeu a nadar, tal como outras pessoas da sua idade.
Com o tempo a aldeia foi evoluindo com a construção de novas casas, devido ao facto de as famílias serem numerosas afirmando José que “havia necessidade de construir”. Por esse motivo a aldeia aumentou e começou a existir mais serviços, apesar de ainda não haver lar de idosos nem infantários, José afirma que “existia a Cooperativa das Minas do Pejão, as locomotivas do Pejão a passar para o Fojo, tinha um hospital a funcionar”. Com isto, Rosa acaba por contar que a sua avó e a sua mãe trabalharam nesse hospital acrescentando que estas faziam um pouco de tudo.
Com estas recordações ambos acabam por se recordar de Jean Tyssen que José afirma ser “quem mais desenvolveu a nossa zona”, relembrando os feitos que ele fez e os projetos que ele desenvolveu. Ainda acabou por informar que “ele faleceu na Bélgica mas o corpo dele veio para aqui (…) ele quis ficar aqui junto dos mineiros”.
Acabam depois por falar da vida amorosa, como era antigamente, e referindo Rosa que o seu relacionamento com José “foi daqueles primeiros namoricos que deu certo”, acabando depois por falar dos projetos que participaram juntos, demonstrando a vida ativa que ambos tinham na aldeia, como por exemplo, o José ter sido um dos fundadores do Grupo de Teatro e do Rancho da Senhora das Amoras. E ainda têm um diálogo sobre a parte cultural e o grande desenvolvimento que havia no local, acabando José por informar que “o primeiro hipermercado de Portugal foi aqui era a Cooperativa do Pejão. Era um hipermercado! Era um continente! Era um autêntico continente!”.
José também fala sobre o encerramento das Minas, da Cerne e de outras empresas afetou a zona. Acaba por falar do trabalho nas minas, a falta de proteção e de segurança que existia, que acabou mais tarde por afetar uma parte dos mineiros, incluindo José, com doenças, como é o caso da silicose - “doença profissional que os mineiros apanhavam derivado do pó do carvão”.
Ainda falam sobre a ligação que têm com a agricultura e o convívio que existia, como é o caso dos jantares depois do trabalho e das canções que cantavam, que José afirma que “isso até já era mais antigo que nós (…) o Passar ao Ribeirinho, do Linho”.
José ainda fala sobre a sua paixão pela música e por compor músicas e poemas, acabando por no final da entrevista mostrar-nos um poema que fala sobre o seu trajeto de vida.
O poema é o seguinte:
“Nasci de família pobre
Nesta aldeia tão querida
Vou contar desde criança
O que foi a minha vida
O meu pai e a minha mãe
Trabalhavam sem parar
Construíram uma casinha
Para nela eu ir morar
Nasci magro e pequenino
Estive quase a morrer
Minha mãe foi que me disse
Que consegui sobreviver
A minha avó Guiomar
Levava-me para casa dela
Para não ficar sozinha
Eu ia dormir com ela
Mais tarde fui para a escola
Aprender a ler e a escrever
Mas quando chegava a casa
Tinha sempre o que comer
Meu brinquedo eram ovelhas
Que eu levava a pastar
Lá na Quinta da Fervença
Onde costumava andar
Ajudava os meus pais
Nessa quinta abençoada
Cantava como rouxinol
Nas margens do rio Arda
Mais tarde ao sair da escola
Conheci uma donzela
Rapariga tão bonita
Apaixonei-me por ela
A cultura e o desporto
Passaram na minha vida
Fiz muito por esta terra
Por esta terra tão querida
Casei com essa donzela
Que amei sempre com carinho
Tivemos os três rebentos
Construímos o nosso ninho
Os filhos foram crescendo
No amor e na amizade
Hoje são os meus amigos
Que me dão felicidade
Vi três irmãos a partir
Luís Palmira e Alfredo
Foi o cancro que os tramou
Deus quis levá-los mais cedo
Veio meu neto primeiro
O filho do Daniel
É “perdido” pelo avô
E chama-se Rafael
Nasceu a primeira neta
E digo isto com fé
É filha do Paulo César
E chama-se Maria José
Nasceu a Lara depois
No dia de anos do seu mano
Eu já fiz sessenta e dois
Podeis crer não há engano
A Rosa Íris chegou
E disse pra Marizé
Eu também princesa sou
E gosto do avô Zé
Cheguei aos sessenta e cinco
E sinto-me feliz
Por ter a família unida
Que foi o que sempre quis
Cheguei a 2020
E veio uma pandemia
Revirou o mundo do avesso
O vírus que ninguém conhecia
Cheguei aos sessenta e sete
Com a covid a governar
Prevejo futuro negro
Para os que vão cá ficar
O planeta doente
Cientistas a dizer
Já não sei se vai ter cura
Com “malucos” no poder”
José Gonçalves